Julia Micaelly Ribeiro Carvalho, de 20 anos, entrou na puberdade aos 4 anos e na menopausa aos 16.
Divulgação/Redes sociais
A puberdade chegou aos 4 anos de idade e a menopausa aos 16, dois problemas que causaram um forte impacto físico e emocional na vida da maranhense Julia Micaelly Ribeiro Carvalho.
Hoje, aos 20 anos, depois se superar tantos traumas, ela vive um dos momentos mais felizes de sua vida, a celebração do seu casamento! E já projeta a realização de outro sonho, ser médica especializada em ginecologia e obstetrícia.
Ao g1, Julia Micaelly contou sua história de superação, com o objetivo de alertar as pessoas sobre o grave problema que é a puberdade precoce e a menopausa cirúrgica.
Puberdade precoce
Nascida na cidade de Pedreiras, a 245 km de São Luís, Julia Micaelly começou a sentir as mudanças em seu corpo logo após mudar do interior do estado para a capital, onde veio morar com três anos de idade. Aos 4 anos, ela já tinha um suor forte debaixo do braço, depois vieram os pelos nas axilas e no órgão genital. Essas alterações causaram vergonha e angústia.
“Eu ficava muito triste porque eu não me identificava com as outras meninas em nenhum sentido, porque a minha mente também era mais evoluída. Eu brincava normal, só que era umas coisas de criança que eu olhava e para mim não fazia sentido reproduzir. Eu fazia natação e olhava as meninas com o corpinho de criança e o meu não era assim e eu ficava tentando entender por que que era diferente. Eu ficava muito envergonhada do meu corpo”, relata Julia.
Por falta de informação, os pais dela não buscaram ajuda no início, somente aos sete anos, depois de muitos exames, veio o diagnóstico de puberdade precoce.
🔍 De acordo com o Departamento Científico de Endocrinologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), a puberdade é a fase de transição entre a infância e a idade adulta, marcada por mudanças físicas, emocionais e hormonais. No período, o corpo começa a se desenvolver e a adquirir características adultas, como o crescimento de pelos corporais, mudanças na voz e o desenvolvimento dos órgãos reprodutivos. A puberdade precoce é causada pelo aumento antecipado dos hormônios sexuais no sangue. Existem algumas causas possíveis, como genética, causas orgânicas ou ambientais.
Ao procurar um endocrinopediatra, médico especialista em doenças relacionadas ao sistema hormonal das crianças, Júlia Micaelly descobriu por meio de uma série de exames, que já estava a ponto de menstruar com apenas 7 anos, além disso, tinha idade óssea de 12 anos.
Logo em seguida a menina começou a receber o tratamento oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS), para atrasar a puberdade precoce de forma rápida. A medicação, que era por meio de injeção, causou mais transtorno físico para a pequena Julia Micaelly.
“Eu tomava injeção três vezes no mês e eu ficava muito chateada, ficava muito triste, porque doía muito, pois o remédio é à base de óleo e dói muito. Eu chorava e era muito angustiante para os meus pais, principalmente porque era toda aquela coisa de ficar me segurando e eu chorava. Eu acredito que foi muito desgastante tanto para mim quanto para eles”, destaca.
Além da dor física, Julia precisou lidar com um turbilhão de emoções causadas pela desregulação hormonal.
“O problema me afetou de uma forma muito brutal psicologicamente, foi questão de quase dois anos e meio para eu ficar 100% bem. Eu entrei em depressão no começo, eu não queria sair de casa, eu só chorava e era altamente agressiva, agressiva com todos ao meu redor. Eu não aceitava ajuda de ninguém. Eu era revoltada, eu falava que ninguém me entendia, ninguém entendia a minha dor. Minha mãe tentava dizer que entendia, eu falava que ela não entendia, porque não era com ela. Foi extremamente difícil lidar com toda essa mudança”, lamenta Julia Micaelly .
O tratamento contra a puberdade precoce durou até os 11 anos, quando Julia Micaelly pôde menstruar.
As causas da puberdade precoce em Micaelly não foram identificadas pelos médicos, mas há uma possibilidade de ser um problema genético. A jovem tem dois irmãos, um de dois anos e outro de 13, que já está fazendo tratamento hormonal, pois o corpo dele estava se desenvolvendo muito rápido para a idade que tem.
Julia também tem uma prima por parte de pai que teve puberdade precoce. Ela não fez nenhum tratamento e acabou menstruando aos oito anos de idade.
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Menopausa precoce
Após tratar a puberdade precoce, Julia enfrentou outro desafio ainda maior, quando chegou aos 16 anos, se deparou com a menopausa precoce, causada pela perda dos dois ovários.
Arquivo pessoal
Após tratar a puberdade precoce, Julia Micaelly enfrentou outro desafio ainda maior, quando chegou aos 16 anos, se deparou com a menopausa precoce, causada pela perda dos dois ovários.
Julia conta que não sentia sintomas de que tinha um cisto hemorrágico, pois ele se desenvolveu de forma silenciosa e rápida, em cerca de três meses. O problema foi descoberto quando o cisto se rompeu, destruindo o ovário esquerdo, causando uma forte hemorragia.
A então adolescente foi levada às pressas para o hospital e precisou ir para a cirurgia de emergência. No momento do procedimento, o ovário direito também se rompeu nas mãos do médico e Julia Micaelly ficou sem os dois ovários, o que causou a menopausa precoce.
🔍 Segundo a Sociedade Brasileira de Ginecologia, a menopausa acontece naturalmente ao final do período menstrual, geralmente ocorrendo entre os 45 e 55 anos. Porém, a remoção cirúrgica de ambos os ovários antes da idade média da menopausa natural é chamada de menopausa cirúrgica, que causa a menopausa precoce, pois os ovários são os órgãos responsáveis por produzir os hormônios sexuais femininos, como estrogênio e progesterona, que controlam o ciclo menstrual e outras funções do corpo. A menopausa precoce pode ser causada também por outros problemas como predisposição genética, doenças, tratamentos médicos, entre outros.
As causas do crescimento rápido do cisto e rompimento dos ovários de Julia nunca foram descobertas pelos médicos. Com a menopausa aos 16 anos, a jovem se viu diante de outro ciclo avassalador de emoções, como sensação de estar sozinha, fora os sintomas físicos como o calor excessivo.
“Eu senti que estava sozinha. A médica era muito boa, mas ela não entendia de fato o que estava acontecendo comigo. E ainda tinha os calores da menopausa, pois eu ficava debaixo do chuveiro chorando. Sentia um calor que parecia que eu tinha febre. E eu chorava muito, ficava zangada com isso. Eu ficava falando assim: ‘Meu Deus, por que comigo? Eu não sei lidar com isso, Senhor, nunca vou aprender a lidar com isso. Minha vida acabou’. Não foi fácil de jeito nenhum”, lamenta.
Sem os hormônios produzidos pelos ovários, houve um grande desequilíbrio emocional, era como se Julia vivesse sempre uma intensa Tensão Pré-Menstrual a famosa TPM, o que lhe causava um forte sentimento de angústia. Outra mudança drástica foi com o metabolismo que, segundo Julia Micaelly, já era lento e ficou pior. Em seis meses ela ganhou 10 quilos.
“Eu sentia uma sonolência, fraqueza, parecia assim um desânimo. E ainda tive a dificuldade para emagrecer, pois o meu apetite aumentou e a fadiga veio, então eu engordei uns 10 quilos em seis meses. Foi a questão de comer muita besteira também, porque eu só comia besteira e tinha muita fome. E eu só não engordei mais, porque eu faço exercício físico, nunca parei. Minha médica sempre falou que para mim não tinha jeito, eu tinha que fazer exercício querendo ou não. Depois eu passei por um processo de emagrecimento, mas foi muito difícil, muito difícil mesmo”, conta.
Com a menopausa precoce, Julia Micaelly começou o tratamento com anticoncepcional específico para mulheres nessa condição, porém, passou por diversas complicações, como candidíase de repetição, útero atrofiado e o mais grave, desenvolvimento de um prolactinoma, que é um tumor que se desenvolve na hipófise, uma glândula que fica na base do cérebro e produz um excesso do hormônio prolactina. Esse tumor, que geralmente é benigno, faz sair leite dos seios.
O que é a menopausa precoce e por que ela acontece?
Ao descobrir o problema, Julia ficou desesperada, achando que ia morrer. Atualmente ela faz tratamento contra o tumor, usando um medicamento semanal específico. Caso ele não desapareça, vai ter que ser retirado por meio de cirurgia.
Medo de não poder ser mãe e óvulos congelados
Outro sentimento que deixou Julia Micaelly angustiada foi o medo de não poder gestar um filho, pois, com a perda dos ovários, ela não tem como produzir os óvulos, indispensáveis na formação do feto.
A jovem conta que, quando passou pela retirada dos ovários, a mãe dela tomou uma atitude que, na época, que lhe pareceu absurda, congelar seus próprios óvulos para que a filha pudesse fazer uma fertilização in vitro no futuro.
“Quando ela fez eu fiquei muito revoltada, eu não queria de jeito nenhum. Mas não era especificamente por causa dela, eu não queria era óvulo de nenhuma mulher, porque eu não gostava muito da ideia de eu gerar um bebê que não era do meu óvulo, que não era do meu DNA. Na época isso significava muito para mim, eu ainda estava naquele processo de luto, de revolta, era muito difícil. Na minha cabeça eu não queria engravidar dessa forma e também achava que um homem não ira querer casar comigo e passar por todo esse processo”.
Porém, com o passar do tempo, Julia Micaelly amadureceu a forma de pensar e hoje agradece a sua mãe por fazer o congelamento dos óvulos.
“Atualmente eu agradeço a minha mãe imensamente por não ter me ouvido e ter iniciado o processo do congelamento dos óvulos. Hoje eu não ligo para isso mesmo, mesmo se não fosse o óvulo da minha mãe, se fosse de outra mulher, tanto faz, vai ser meu filho de todo jeito. O que me ajudou a superar a dificuldade em aceitar eu acho que foi o tempo, não tem uma coisa específica, foi o tempo”, destaca.
Casamento e busca pela profissão
Julia Micaelly e José Adolfo se casaram no último sábado (27), em Pedreiras, no Maranhão.
Divulgação/Redes sociais
Após lidar com tantos traumas, Julia passa agora por um momento de muita felicidade, depois de três anos de namoro, ela se casou com o jovem José Adolfo, no último sábado (27), em Pedreiras.
Segundo Julia, Adolfo sempre lidou de forma muito tranquila com o fato de ela já estar na menopausa e também por ter que fazer a fertilização in vitro no futuro.
“Ele não exige nada e já sabe sobre a FIV e para ele está tudo bem. Ele sempre acompanhou todo o processo de forma muito tranquila”, afirma.
Após a lua de mel, Julia Micaelly e Adolfo pretendem ir juntos para o Paraguai estudar medicina. A jovem pretende se especializar em ginecologia e obstetrícia.
“Eu quero fazer uma especialização em menopausa precoce, porque eu tenho muita propriedade para falar sobre isso. E uma das coisas que eu mais senti quando entrei na menopausa foi que eu estava sozinha, que a médica que estava ali era muito boa, mas não entendia de fato o que estava acontecendo comigo. Então, quando eu olhar para uma menina de 16 anos que está na menopausa precoce, ela não vai olhar na minha cara e achar que eu não sei o que ela tá passando, porque eu passei por isso”, destaca.
Apoio nas redes sociais
Maranhense entrou na puberdade aos 4 anos e menopausa aos 16
Além de querer ser médica para ajudar meninas que venham a passar o que ela passou, Julia também usa as redes sociais para falar sobre a puberdade e menopausa precoce de forma leve e clara, sempre alertando para os sintomas desses problemas e sobre a importância de buscar ajuda médica.
Julia Micaelly também fez um grupo em um aplicativo de mensagem, onde ela e outras meninas compartilham experiências sobre a menopausa precoce. “Atualmente a gente conta com 25 membros no grupo. É complicado porque realmente a mulher sofre muito, as mulheres sofrem muito, então a gente fica falando sobre esse assunto”.
Sintomas da puberdade precoce
Veja as características sexuais secundárias em meninas e meninos, segundo o Departamento Científico de Endocrinologia da SBP.
Meninas
Surgimento do broto mamário – primeiro sinal
Pelos pubianos
Pelos axilares
Odor na axila
Acne
Modificação do contorno do corpo
Menstruação (menarca) – a última característica
Meninos
Aumento do volume dos testículos – primeiro sinal
Aumento do pênis
Pelos pubianos
Pelos axilares
Modificação da voz
Pelos faciais
Primeira ejaculação (espermarca) – última característica
Sintomas da menopausa precoce
Os primeiros sintomas da menopausa de ordem psicológica são:
Oscilação no humor
Irritabilidade
Tristeza e depressão
Problemas de concentração
Falta de desejo sexual
A redução dos níveis dos hormônios femininos também pode causar algumas complicações como:
Ansiedade e depressão;
Infertilidade;
Osteoporose;
Redução de libido e desconfortos na relação sexual;
Piora importante da qualidade do sono;
Ganho de peso;
Piora do rendimento intelectual;
Risco de eventos cardiovasculares como infarto ou derrame em idade mais precoce.
Outros sintomas ligados à menopausa são:
Ondas de calor ou fogachos;
Alterações no sono;
Ganho de peso;
Alterações de humor como irritabilidade ou melancolia;
Suores noturnos;
Diminuição da libido;
Irregularidades na duração dos ciclos menstruais e na quantidade do fluxo sanguíneo;
Alterações na pele;
Secura vaginal.
Perda de massa óssea e muscular.