Movimentações militares e declarações de Donald Trump levantam possibilidade de uma ação direta dos EUA contra o Irã. Especialistas avaliam possíveis consequências. Donald Trump exige rendição incondicional do Irã e ameaça o líder supremo do país
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, deixou a reunião do G7 no Canadá antes do previsto para tratar do conflito entre Israel e Irã. Já em Washington, nesta terça-feira (17), o norte-americano se reuniu com membros do Conselho de Segurança Nacional e deu sinais de que poderia entrar diretamente no confronto.
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▶️ Contexto: Israel e Irã trocam ataques desde sexta-feira (13). Militares israelenses anunciaram uma operação para destruir alvos nucleares iranianos. Teerã retaliou lançando mísseis contra cidades como Tel Aviv, Haifa e Jerusalém. Mais de 240 pessoas morreram nos dois países.
🤝 Os Estados Unidos apoiam Israel. Em fevereiro, Trump retomou a política de “pressão máxima” contra o Irã, tentando forçar o país a negociar um novo acordo que impedisse o desenvolvimento de armas nucleares.
Trump já havia declarado que, se as negociações fracassassem, poderia atacar o Irã com o apoio de Israel.
Apesar disso, sobre os ataques lançados por Israel na sexta-feira, o governo americano afirmou que não participou da operação.
👀 Sinais: Nas últimas horas, o tom da Casa Branca mudou. O retorno antecipado do G7 marcou esse giro na postura. O próprio Trump, em mensagens públicas, indicou que os EUA podem se envolver diretamente no conflito.
Em uma rede social, Trump usou a palavra “nós” — em provável referência à aliança com Israel — ao afirmar que “já tinha o controle do céu do Irã”.
O presidente disse ainda saber onde o líder supremo iraniano, Ali Khamenei, estaria escondido e escreveu que não o mataria “por enquanto”, mas que a paciência estava chegando ao fim.
Por fim, Trump exigiu uma rendição incondicional do Irã.
Os Estados Unidos também enviaram mais caças para o Oriente Médio e reforçaram a presença militar na região. Além disso, segundo a Reuters, um grande número de aeronaves americanas saiu da Europa em direção ao Oriente Médio.
🔎 Maurício Santoro, doutor em Ciência Política pelo IUPERJ e colaborador do Centro de Estudos Político-Estratégicos da Marinha do Brasil, avalia que o reforço militar sinaliza uma possível entrada dos EUA no conflito.
“Se os americanos, de fato, se juntarem na guerra contra o Irã, vai ser um aumento muito grande da escala desse conflito”, afirma.
🔎 Já para Priscila Caneparo, doutora em Direito Internacional, a entrada dos EUA pode provocar um conflito ainda mais sangrento, com mortes de civis.
“O que a gente observa que os Estados Unidos são os únicos atores competentes que teriam o poder num contexto mundial para neutralizar o programa nuclear iraniano, já que possuem artilharia para tanto, diferentemente de Israel.”
Como seriam os EUA no conflito?
O presidente dos EUA, Donald Trump
Ken Cedeno/Reuters
A movimentação militar dos Estados Unidos no Oriente Médio é vista por especialistas como um indicativo claro de que Washington pode estar se preparando para entrar diretamente n entre Israel e Irã.
Para o professor Maurício Santoro, os sinais vão além de uma simples demonstração de força. Os deslocamentos de tropas, os tipos de armamentos enviados e o uso de navios especializados em desminagem sugerem uma preparação concreta para o combate.
“Pela escala dos deslocamentos, pelo tipo de armamento que os Estados Unidos estão deslocando para o Oriente Médio, são todos os sinais de uma preparação para guerra”, diz.
🔎 Segundo o professor, mesmo que a movimentação seja uma forma de o governo americano pressionar o Irã, trata-se de “um teatro bem caro e expressivo”.
Santoro acredita que os EUA demonstram estar se preparando para a batalha, inclusive com a possibilidade de um conflito naval no Golfo Pérsico.
Em caso de um embarque no conflito, o poder militar dos Estados Unidos traria um peso diferente às tensões.
Somente os americanos, por exemplo, possuem bombas capazes de destruir bunkers do Irã onde estão centros de enriquecimento de urânio.
Um ataque a essas estruturas subterrâneas representaria um duro golpe no programa nuclear do Irã e é visto como essencial para que Israel consiga atingir seus objetivos no conflito.
Por outro lado, apesar da potência bélica, uma entrada dos Estados Unidos no conflito geraria consequências políticas internas para o governo Trump, segundo a professora Priscila Caneparo. Isso porque o presidente estaria descumprindo promessas de campanha.
“A sociedade civil quer um afastamento de problemas justamente correlacionados à guerra, até porque o Trump falou que não iria gastar dinheiro com isso, mas que se preocuparia com problemas internos dos Estados Unidos”, explica.
“Acho que vai pegar muito mal para ele, em uma perspectiva de não corresponder ao que seus eleitores e a sua base eleitoral estão justamente esperando dele.”
O impacto para o Irã
Um incêndio atinge depósitos de petróleo de Shahran, no Irã, em meio a ataques aéreos de Israel
Atta Kenare/AFP
Os especialistas ouvidos pelo g1 apontam que a entrada dos EUA no conflito exporia ainda mais as fragilidades internas do Irã. Para Priscila Caneparo, uma operação militar americana colocaria em xeque o programa nuclear iraniano.
“Os Estados Unidos são os únicos atores competentes que teriam o poder, no cenário internacional, para neutralizar o programa nuclear iraniano, já que possuem artilharia para tanto, diferentemente de Israel”, explica.
Do ponto de vista estratégico, os especialistas esclarecem que, em um primeiro momento, a motivação central dos EUA no conflito seria interromper o programa nuclear iraniano. Por outro lado, há sinais de que os americanos também pretendem derrubar o regime dos aiatolás.
“Se o regime sobreviver a essa guerra, vai sair muito fragilizado. Existe um descontentamento muito grande da população, que pede por reformas e mudança política”, afirma o professor Maurício Santoro.
Por outro lado, Caneparo ressalta que um possível colapso do regime dos aiatolás poderia gerar uma radicalização ainda mais profunda na região e aumentar o risco para Israel e seus aliados.
“Grupos como Hamas, os Houthis e o Hezbollah não são facilmente destruídos porque são ideias. E, a partir do momento em que os EUA se envolvessem nesse conflito diretamente, essas ideias se fortaleceriam dentro da população civil, não apenas no Irã, mas em boa parte do mundo árabe no Oriente Médio”, analisa.
Um problema global
Uma tocha de gás em uma plataforma de produção de petróleo nos campos de petróleo de Soroush é vista ao lado de uma bandeira iraniana no Golfo Pérsico, no Irã
Raheb Homavandi/File Photo/Reuters
A entrada dos EUA no conflito traria consequências globais. Do ponto de vista econômico, Maurício Santoro alerta que o Irã já anunciou que, se for atacado, pode minar o Estreito de Ormuz. A região liga o Golfo Pérsico ao mar aberto e é uma importante rota para o petróleo.
“Seria bem complicado para a navegação comercial. Isso faria com que o preço do petróleo disparasse globalmente. Provocaria um aumento expressivo”, afirma.
A professora Priscila Caneparo afirma que uma guerra na região também é desfavorável inclusive para aliados do Irã, como a China e a Rússia.
“Dentro dessa premissa, eu acho que o impacto global não necessariamente vai ser militar, mas vai ser muito mais de pressão em relação ao que está acontecendo ali naquela região”, diz.
Santoro complementa afirmando que a China tem apresentado uma postura cautelosa em relação ao conflito. Vale lembrar que o governo de Pequim fez uma série de acordos econômicos e militares com o Irã nos últimos anos.
“Não me parece que o governo Xi Jinping iria fazer nenhum tipo de manobra arriscada, mesmo que perdesse esse aliado no Golfo Pérsico. Tem muita coisa em jogo ali”, afirma.
Os analistas avaliam que, em um primeiro momento, o impacto militar direto do confronto deve se concentrar na própria região. O maior risco agora, segundo eles, é de uma escalada generalizada no Oriente Médio, com aumento das mortes de civis.
“Com certeza seria um conflito muito sangrento. Teria bastante baixas civis, tamanha a capacidade de destruição dos Estados Unidos — vide o que aconteceu na guerra do Afeganistão e, principalmente, na guerra do Iraque”, diz Caneparo.
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