Decisão vem de um processo de revisão iniciado em 2023 que concluiu não haver base legal suficiente para o procedimento de coleta. Projeto reclama de falta de clareza nas leis europeias. Empresa quer escanear a íris de toda a população mundial para coletar dados
A BayLDA, autoridade de proteção de dados da Baviera, na Alemanha, determinou nesta quinta-feira (19) a exclusão de dados coletados pela World, empresa que tem escaneado a íris de milhares de pessoas pelo mundo em troca de dinheiro.
Para o órgão, não existe base legal suficiente para este tipo de coleta.
A World diz que atualmente, os códigos de íris não são mais armazenados e que os coletados anteriormente foram excluídos voluntariamente.
O projeto foi criado pelo bilionário Sam Altman, cofundador da OpenAI, criadora do ChatGPT, e tem coletado dados desde 2021, atuando em diversas parte do mundo, inclusive no Brasil.
O objetivo seria usar esses dados para diferenciar humanos de robôs no futuro, bem como autenticar o login de usuários em sites e aplicativos.
A BayLDA é responsável por analisar o tratamento de dados da World na União Europeia porque a sede do projeto no continente fica na Alemanha.
O órgão informou que começou a revisar a atuação da World em abril de 2023. Ao concluir o processo, determinou:
“a exclusão de determinados conjuntos de dados, até agora coletados sem base legal suficiente”
e que a World seja “obrigada a obter consentimento explícito para determinados passos de processamento no futuro”.
Segundo a autoridade, essas determinações devem ser seguidas pela empresa em seus processamentos de dados em toda a Europa. A ordem “foi comunicada à empresa, que informou que irá contestar a decisão judicialmente”, disse a BayLDA.
O que diz a World
A World informou ao g1 que os resultados da investigação conduzida pela BayLDA estão, “em grande parte, relacionados a operações e tecnologias que já foram descontinuadas ou substituídas em 2023”.
“Em outras palavras, o parecer técnico emitido pela BayLDA se refere a práticas que já foram ajustadas pela World”, disse a organização.
O órgão afirmou que, apesar de melhorias feitas pela World, “ainda são necessárias adaptações para alinhar o processamento de dados da empresa com os regulamentos aplicáveis”. Entre outras coisas, o projeto deve “fornecer um procedimento de exclusão” um mês após a decisão final.
A World acrescentou que “atualmente, os códigos de íris utilizados para verificar o World ID de uma pessoa não são mais armazenados. E que “os códigos de íris coletados anteriormente foram excluídos voluntariamente, garantindo que nenhum dado pessoal seja mantido para o funcionamento do World ID”.
Ela também afirmou que a decisão alemã indica “a urgente necessidade de estabelecer uma definição precisa e consistente de anonimização na União Europeia, capaz de garantir a proteção de dados pessoais na era da inteligência artificial (IA)”.
Espanha
Em março, a Agência Espanhola de Proteção de Dados da Espanha já havia determinado a interrupção da coleta de dados pela World no país. A autoridade repercutiu a decisão nesta quinta e disse que a decisão alemã ratifica a medida adotada anteriormente.
Na decisão de março, a agência espanhola afirmou que o empreendimento da World pode ser uma violação das regras de proteção de dados da União Europeia. A decisão foi mantida pelo Tribunal Supremo da Espanha, rejeitando um recurso movido pelos proprietários da organização.
(Correção: o g1 errou ao informar que o órgão fiscalizador de proteção de dados da Espanha determinou nesta quinta-feira que a World exclua todos os dados de íris escaneadas no país. A decisão foi da autoridade de proteção de dados da Baviera, na Alemanha. A informação foi corrigida às 17h40).
Escaneamento no Brasil
No Brasil, a World está coletando dados em 20 pontos de São Paulo. Até o momento, a empresa afirma ter escaneado as íris de 189 mil pessoas no país, segundo dados desta quinta-feira (19) divulgados pela própria empresa.
Quem aceita oferecer seus dados ganha tokens da Worldcoin, moeda digital da empresa que pode ser convertida para o real.
O projeto levanta questionamentos sobre como vai tratar informações biométricas de milhões de pessoas e qual é a finalidade da coleta desses dados, que são considerados sensíveis pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
👁️ O que é o projeto
Segundo a organização, o escaneamento da íris tem como objetivo auxiliar na distinção entre humanos e robôs criados por inteligência artificial (IA). Entre os potenciais usos da inovação está a prevenção de perfis falsos em sites e redes sociais, por exemplo.
A ideia da World é que essa tecnologia ainda substitua o Captcha, uma ferramenta de segurança usada por vários sites para certificar que quem está acessando é um humano e não um robô (veja na imagem abaixo).
Teste do reCAPTCHA pode ser validado automaticamente em certas circunstâncias
Reprodução
A estrutura da World tem três frentes:
👁️ World ID, como é chamado o passaporte digital que transforma o registro da íris em uma sequência numérica;
🪙 Token Worldcoin (WLD), a criptomoeda que será distribuída como recompensa para todos os inscritos;
📱World App, o aplicativo que permite fazer transações com a criptomoeda.
A “foto” da irís da pessoa é tirada com a câmera Orb (veja na imagem abaixo) e é usada para criar um código numérico para identificar cada usuário e, de acordo com a World, é apagada logo em seguida.
Dispositivo usado para criar ‘passaporte digital’ da Worldcoin
Darlan Helder/g1
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